volume 4 / número 2 / dez 2023

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Francisco Brito Cruz
Mariana Valente
Rafael Cardoso Sampaio

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Em nosso último editorial, tratamos sobre como 2023 foi um marco importante para verificar o impacto das tecnologias em múltiplas dimensões da sociedade, notadamente com a proliferação e consolidação de sistemas de inteligência artificial generativa, como ChatGPT e Midjourney. E como desafios regulatórios se impunham diante deles.

Tendo agora em vista o final de 2023 e início de 2024, percebe-se que a inteligência artificial persiste como o grande assunto de interesse do momento no campo de pesquisas sobre tecnologia. Se no último editorial demonstrávamos animação com a possível aprovação do PL 2630/2020, apelidado de “PL das Fake News”, agora sabemos que o mesmo foi enterrado e reiniciado do zero. A regulação da inteligência artificial também avançou no período, mas ainda enfrenta incertezas e conflitos relevantes no parlamento.

Esta segunda edição de 2023* apresenta interessantes pesquisas voltadas para questões muito práticas dos impactos dos meios digitais na sociedade, seja em termos de debates, seja em termos de aplicações e seus efeitos. Contendo cinco artigos, ela aborda aspectos importantes do debate contemporâneo sobre os meios digitais.

O primeiro artigo de Ana Carolina da Silva, Carlo José Napolitano, Enrico Gibotti, Lucas Laurentiis, Matheus Orlando, Milena Brito e Tatiana Stroppa, “Limites à liberdade de expressão na internet em julgamentos no Brasil e na Alemanha: democracia e disputa entre fascismo e antifascismo”, analisa uma importante questão contemporânea, nomeadamente os limites da liberdade de expressão, muitas vezes reivindicada para a disseminação do discurso do ódio e de discursos fascistas. Os autores realizam estudos comparados de caso de decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro e pelo Tribunal Constitucional Federal da Alemanha (TCFA). O estudo conclui que nos casos analisados houve uma prevalência da liberdade de expressão em detrimento de outros direitos e então analisam algumas consequências disso.

O segundo artigo, “Mídia independente, mas hegemônica?  Práticas de noticiabilidade em portais de jornalismo autointitulados independente da extrema direita”, de Sabrine Weber, analisa cinco portais de notícias digitais mais compartilhados em grupos de mensagens digitais bolsonaristas. A análise revela a mobilização de paixões, valores tradicionais e oposição à esquerda, frequentemente com conteúdo fraudulento.

O terceiro artigo, “Personalização algorítmica no Spotify e a premissa de que somos o que ouvimos”, de Helena Strecker, faz uma profunda reflexão sobre os algoritmos de personalização do aplicativo Spotify.  Explorando materiais da empresa e dois exemplos emblemáticos de personalização, o texto analisa a playlist “Descobertas da Semana” e a campanha “Só Você”, destacando contradições na pretensão de ultrapersonalização. Além de questionar a precisão desses algoritmos, considera como eles moldam a formação de sujeitos datificados e identidades algorítmicas.

O artigo “O acesso à internet como um direito cultural: perspectivas jurídicas e socioculturais da participação tecnológica no Brasil”, de Marcelle Cortiano, discute o acesso à internet como um direito cultural no Brasil, analisando a participação tecnológica sob uma perspectiva jurídica e sociocultural. A pesquisa utiliza dados da TIC Domicílios (Cetic.br), para mostrar o contexto do acesso brasileiro às tecnologias de informação e comunicação, concluindo que sua efetivação é dificultada por diversos fatores, necessitando de ações do poder público para sua concretização.

O quinto artigo, intitulado “Colonialismo, ciência e transparência significativa: acesso a dados de plataformas para pesquisa acadêmica no Sul Global”, escrito por Clarice Tavares e Maria Tranjan, revela os primeiros resultados de uma investigação conduzida pelo InternetLab em 2023 e reflete sobre o conceito de “colonialismo de dados/digital”. O objetivo é comparar as discrepâncias no acesso a dados de plataformas entre o Norte e o Sul Global com outros obstáculos relacionados à obtenção, disseminação e geração de informações, influenciados por períodos de regimes autoritários e coloniais.

Finalmente, a edição se finaliza com um resenha de Carolina Esteves Vieira e Natanael Madiã do livro “Desafios: Arte e Internet no Brasil”, de Maria Amélia Bulhões, explorando de que forma a expansão da internet e o progresso da tecnologia influenciam as abordagens artísticas atualmente e causam impacto no cenário artístico existente.

Explorando diversos ângulos sobre o panorama brasileiro nos estudos sociais sobre a internet, a Internet & Sociedade mais uma vez apresenta trabalhos interdisciplinares. Convidamos você a ler e contribuir com novos trabalhos!

Francisco Brito Cruz

Mariana Valente

Rafael Cardoso Sampaio

Os editores

* A presente edição foi publicada com atraso. Nossa revista também sofreu na tarefa de conseguir bons pareceristas para atender à demanda do volume de artigos submetidos. Este problema parece generalizado na ciência brasileira e merece melhor discussão em momento oportuno.